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Projeto “do princípio do mundo” leva sons e imagens de Lafões à galeria Caos

O músico Fernando Mota e o fotógrafo José Sérgio viveram uma semana na região de Lafões e agora apresentam em Viseu um concerto e uma exposição, que resultaram dessa residência artística, disseram hoje à agência Lusa os autores.

O projeto “do princípio do mundo” nasceu no início da pandemia, em 2020, altura em que Fernando Mota começou a “construir uma série de instrumentos com elementos da natureza, sobretudo árvores sinuosas”.

Começou por convidar sete poetas para associar “sonoridades a poemas, depois a ideia passou por associar os sons da natureza a imagens” e daí surgiu o convite para sete fotógrafos com trabalhos muito distintos em lugares muito diferentes.

“Como é que ao olharmos para um território e para estas matérias naturais podemos criar um universo e expô-lo numa instalação visual e sonora? Como é que eu gravo e produzo sons nesses espaços e só com isso criar uma peça sonora?”, questionou o músico, que assumiu ser esse o “grande desafio” do projeto.

À agência Lusa, o músico contou que, no início de janeiro, “com imenso frio”, residiram uma semana na região de Lafões, “na serra de São Macário, em São Pedro do Sul”, sem que se conhecessem antes.

“Foi como um ‘blind date’ [encontro às cegas] e o desafio era perceber o processo criativo deles e perceber como é que eles olham para o mesmo território que eu olho, um espaço natural, e foi isso que fizemos”, acrescentou o músico residente em Lisboa.

Após a residência artística de Fernando Mota e José Sérgio, em coprodução com o Teatro Viriato, em Viseu, nasce agora uma exposição sonora, que inaugura este sábado, com 22 fotografias, um vídeo e sons, na galeria Caos.

“É enriquecedor, porque a fotografia não tinha de ilustrar o que ele estava a fazer, nem o som tem de acompanhar as minhas fotografias. É o olhar de cada um, nas nossas manifestações de arte, sobre o mesmo lugar”, defendeu José Sérgio.

O fotógrafo, que reside no Porto e também dedica parte do seu trabalho ao fotojornalismo, defendeu que “não se trata de um documentário”, mas sim de “uma visão livre, e que pretende ser livre” de um espaço natural.

“No fundo, se 100 pessoas virem a exposição, são 100 histórias ou mundos que podem sair de lá, porque cada um cria o seu mundo, a sua história na envolvência dos sons e imagens que sugerimos pela nossa visão”, apontou José Sérgio.

Fernando Mota, que dedica parte do seu trabalho profissional a criar músicas para peças de teatro, revelou que, neste projeto, o “foco principal é o de escutar, porque isto tem um grande grau de imprevisibilidade e, por isso, é importante escutar, tal como acontece na sociedade e parece que já ninguém escuta”.

Os artistas contaram que, no primeiro dia, à chegada do Poço Azul, em São Pedro do Sul, ambos ficaram “em silêncio, sem gravar, sem fotografar, sem qualquer registo, só a contemplar” a natureza sem que o tivessem combinado.

“E ambos nos questionámos, mas não estás a fazer o teu trabalho? Estávamos os dois a escutar, a contemplar, e só depois disso é que começámos a registar os sons e imagens da natureza”, disseram.

Este projeto, defendeu Fernando Mota, “é uma forma de sair das grandes cidades e de envolver as comunidades, principalmente em territórios mais desertificados e, numa visão mais ambiciosa, é também dizer a essas pessoas que elas também são tidas em conta”.

“Porque é dar valor à natureza. Isto faz-nos pensar, como é que andamos a destruir os territórios e a natureza em vez de usufruirmos deles, porque é magnífico usufruirmos da natureza”, acrescentou José Sérgio.

Da natureza saíram também sons que Fernando Mota trabalhou, ou seja, “foram amplificados para criar esta sonoridade a que podem chamar de música ou não” e que no seu entender está “no limite de ser uma peça sonora”.

Uma sonoridade que dá mote ao concerto de sexta-feira, no Teatro Viriato, e que acompanha a exposição, que inaugura no final de uma caminhada sonora na cidade de Viseu, “que também passa por ambientes de natureza”.

Um percurso que definiu como “se fosse uma partitura” para que se faça “um exercício de escuta muito afinada e um exercício de estar, onde os aparelhos telefónicos estarão desligados, porque a ideia é escutar o silêncio ou a cidade”.

“O concerto é um acumular de sons das várias residências que tenho feito. A cada concerto acumulo sons e experiências dos lugares e também tem, claro, da serra de São Macário, mas a terra e a água são elementos sempre presentes”, adiantou.

Fernando Mota acrescentou que além da terra e da água, “há outros elementos naturais” que disse “manipular ou tocar” em palco, onde também estará “uma árvore como elemento central” e onde os instrumentos musicais tradicionais não entram.

Viseu é a quinta localização, de sete, por onde o projeto já passou, fica a faltar Almada e Açores, e, entretanto, passou por Setúbal (serra da Arrábida), Seixal (mouchões da baía), Nelas (Lapa do Lobo) e Fundão (serra da Estrela).

Lusa

 

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