O Guarda Ferreira, a testemunha chave do processo, está a ser ouvido no Tribunal da Guarda no processo “Pedro Dias”.
Um testemunho contado pelo jornal digital OBSERVADOR:
«Antes de entrar na sala de audiências, António Ferreira, 42 anos, pediu para falar com o seu advogado um minuto. Pedro Proença saiu da sala e quando voltou pediu ao juiz que “atenta à matéria sensível dos factos ainda bem vivos na sua memória”, Pedro Dias fosse retirado da sala para que o seu cliente pudesse prestar depoimento. Apesar da oposição da advogada do arguido, Mónica Quintela, o juiz concordou. Pedro Dias foi levado para uma sala no tribunal onde assistirá ao depoimento por videoconferência. Quando se levantou para ser levado pelos guardas, abanou a cabeça em sinal de protesto.
Não estão em causa razões de segurança do assistente, mas antes o proporcionar de um ambiente que, já de si condicionado pelas características de uma sala de audiências, proporcionam ao declarante as melhores condições para contribuir para a descoberta da verdade material”, respondeu o juiz presidente Marcos Gonçalves.
O militar da GNR alertou o coletivo de juízes que dado “o seu estado de saúde” não podia permanecer muito tempo sentado. O juiz respondeu-lhe que podia levantar-se as vezes que quisesse e podia parar. Num discurso visivelmente difícil, Ferreira recordou o que viveu naquela madrugada de 11 de outubro de 2016, às mãos de Pedro Dias.
Disse que foi ele quem, com uma lanterna na mão, passou a revista à carrinha Toyota onde o arguido Pedro Dias se encontrava a dormir, sentado no lugar do condutor junto ao hotel da Termas. “O Caetano ficou do lado dele e eu bati no vidro no lado do pendura”. Depois foi até ao carro patrulha para apurar se havia “alguma pendência” relativamente à viatura. Pedro Dias explicou, a certa altura, aos militares que a proprietária da carrinha era “uma sócia”, justificando esta não estar em seu nome.
Ferreira conta que foi Caetano quem depois se afastou para mais um contacto para apurar se Pedro Dias estava referenciado pela polícia. Quando colega voltou trazia informações, obtidas via rádio, de que “Pedro Dias era perigoso e estava referenciado pelo posto de Fornos de Algodres”. Mais. Podia estar armado. O juiz perguntou se o arguido terá ouvido esta informação naquela madrugada e o militar respondeu que sim. Terá sido neste momento que os dois militares foram distraídos por um barulho vindo da vegetação.E que Pedro Dias abriu fogo.
“Quando eu virei a cara, estava ele com a arma”, demonstrou Ferreira, usando a mão direita para exemplificar ao juiz. “Se te mexeres, fodo-te os cornos”, terá dito Pedro Dias, para depois abrir fogo contra o guarda Caetano. “Qual seria a arma?”, perguntou-lhe o juiz. “Devia ser uma 6.35 ou uma 7.65 mm, uma arma pequena”, respondeu. Ferreira disse ainda que, naquele momento, começou a gritar pelo colega. “És burro? Não vês que ele está morto?”, respondeu Pedro Dias, obrigando-o a levantar a mão direita e, com a esquerda, livrar-se do cinturão com o coldre da arma.
Ferreira gritou-lhe várias vezes para desaparecer. Mas foi obrigado a entrar no carro patrulha, para o lado pendura, e foi mantido sob sequestro durante um tempo que não consegue precisar.
— Desaparece, leva o que quiseres, deixa-me ficar aqui ao pé dele [colega Caetano que foi baleado] para o socorrer.
— Queres morrer?, terá respondido Pedro Dias.
O guarda Ferreira, que entretanto pediu para se levantar, descreveu as voltas que deu sequestrado no carro patrulha, até que foi parar a um local ermo — que diz desconhecer. Foi obrigado a algemar-se num pinheiro. Baleado, tombou no chão. Quando estava a “perder os sentidos” sentiu que Pedro Dias lhe cobriu o corpo com vegetação. Só mais tarde conseguiu libertar-se. “Tem ideia do que é que Pedro Dias queria ou estava a pensar quando andou consigo no carro?”, perguntou-lhe o juiz. “Não faço ideia o que lhe passou pela cabeça. Ainda hoje não sei”, respondeu Ferreira, que admitiu ter sido impossível escapar. “Não tinha hipótese. A arma estava sempre apontada”.
Quando encontraram Pedro Dias, os dois militares da GNR estavam a fazer uma patrulha por causa dos focos de incêndio que se tinham registado naquela zona. Pedro Dias tinha na carrinha “quatro ou cinco jerricans de combustível” e material agrícola diverso. Quando lhe perguntaram para que servia, o arguido respondeu que este material era para semear aveia.
Tanto o juiz Marcos Gonçalves como a advogado de Pedro Dias perguntaram a Ferreira se aquele material não levantou suspeitas e se não pensaram em lavrar “um auto”. “Eu que não sou da GNR e acharia suspeito”, disse o juiz. O militar respondeu que não. Que o arguido mostrou tudo tranquilamente e explicou para que servia o material, logo não havia motivos para um auto de contraordenação.»
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