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Mortágua: Ossadas para o lixo para sepultar outro defunto

Caso ocorreu na freguesia de Pala, no passado domingo. Familiares do novo defunto e do que antes estava na campa mostram-se revoltados. GNR abriu auto. Junta de Freguesia justifica com cumprimento da lei.

E na hora da sua morte, António Ferreira Gomes, conhecido por “Banana”, de 65 anos, falecido na passada sexta-feira, seguramente não poderia suspeitar o que lhe iria suceder, até chegar ao que se costuma chamar de descanso eterno. Na pequena freguesia de Pala, no concelho de Mortágua, distrito de Viseu, com cerca de 1000 almas vivas, no passado domingo, tiveram de desalojar da cova os restos de um parente seu, para o tentar sepultar. O pior é que os coveiros colocaram as ossadas num contentor do lixo.

“Isso não se faz nem a um animal”, é a reação de Pedro Martins, filho do defunto “Banana”, ouvido pela TVI24, que, ainda a cumprir o luto pela morte do pai, se revela pessoa de poucas palavras, ao contrário do cunhado, Joel Malato, também ele coveiro de profissão noutro concelho, quem, na tarde do passado domingo, se apercebeu do que se estava a passar no cemitério de Pala.

À TVI24, Joel refere que ainda durante o velório viu os colegas coveiros daquele cemitério a abrir uma campa antiga e a retirar “roupas e ossos”.

Isto é para meter num canto e dar um sumiço a isso”, foi a resposta que Joel Malato obteve dos dois coveiros de Pala, quando lhes perguntou o que iam fazer com os restos mortais retirados da campa, onde iria ser sepultado o seu sogro.

Acto contínuo, Joel diz que saiu do local. Mas deu conta que o que tinha sido retirado da cova fora colocado num saco de plástico preto e metido no contentor do lixo.

“Fui ver. Mal abro o contentor do lixo estava tudo à mostra, com a caveira logo em cima”, conta à TVI24. E com a agravante das ossadas pertencerem “ao tio de um meu cunhado, falecido para aí há uns 20 anos”.

Face ao sucedido, foi chamado ao local, o presidente da Junta, Horácio Cunha.

“Foi uma confusão do caraças”, conta Joel, relatando que o presidente da freguesia foi logo questionado pelos familiares. Do defunto que ia a sepultar e do familiar que tinha sido exumado na tarde daquele domingo.

“Já viu que os coveiros mandaram os ossos para o caixote do lixo? E aí o presidente começou a dizer, “ah, não foram eles”, conta Joel Malato, relatando a indignação acrescida de familiares do morto exumado, que também estavam no funeral.

Sem resolução imediata, a GNR de Mortágua foi chamada ao cemitério e “obrigou a porem as ossadas dentro da cova”, segundo Joel Malato. Até porque, segundo Pedro Martins, o filho do defunto, terá sido sugerido depositar as ossadas numa cova nova e colocar o pai na que era usada e lhe estava destinada.

O lugar do morto

António Ferreira Gomes acabou sepultado numa campa nova. Como aliás era seu desejo em vida, segundo contou o filho Pedro à TVI24: “O meu pai sempre disse que queria uma campa virgem, na parte nova do cemitério”. E foi-lhe assim feita a última vontade, se bem que, por um acaso do destino e intervenção da GNR.

“A Guarda foi chamada ao local, porque a família da pessoa que ia ser sepultada, não concordava com a intenção de o corpo ficar na sepultura onde tinham sido retiradas as ossadas. Foi reposta a normalidade e depois levantado o auto que encaminhado para o Ministério Público, da secção de Santa Comba Dão, da comarca de Viseu”, confirmou à TVI24, o tenente-coronel Silva Dias, responsável de Relações Públicas da GNR distrital.

“Havia dúvidas sobre a legalidade da situação, porque há um hiato de tempo a respeitar no que toca à exumação de corpos e outras questões”, salientou ainda o oficial da GNR, assegurando que, “além de alguma revolta das pessoas, não houve qualquer alteração da ordem pública”.

Revoltados ficaram também, ao que a TVI24 apurou, os familiares do falecido que foi exumado, caso de Márcio Gomes, que constatou que o defunto “Banana” ia ser sepultado na “campa que era de um tio do meu pai”, que morreu “para aí, há uns 20 anos”.

Segundo Márcio Gomes, a família nunca terá sido notificada para fazer o levantamento das ossadas – “que eu tenha conhecimento, não!” – o que também é sustentado por Joel Malato, o coveiro e genro do defunto que ia a enterrar no passado domingo.

Se foram ou não notificados, não lhe sei dizer. Mas sei que o senhor presidente falou com eles, com os famliares. Porque ao fim de mais de 20 anos, cumprem-se mais do que os prazos de inumação e esse prazo fora ultrapassado”, sustenta Lara Duarte Campos, advogada da Junta de Freguesia, encarregada de prestar os esclarecimentos sobre a situação ocorrida no cemitério.

“Tinham conhecimento de que iria ser assim”

Ao que a TVI24 apurou, o executivo da Junta de Freguesia de Pala até já reuniu de emergência por causa do sucedido na tarde de domingo.

Horácio Cunha, presidente da Junta, contatado pela TVI24, preferiu delegar na advogada que representa a edilidade, os necessários esclarecimentos.

“Os familiares do defunto sabiam previamente que ele iria ser sepultado numa campa que era de outra pessoa. As pessoas tinham conhecimento de que iria ser assim”, refere Lara Duarte Campos, facto que foi confirmado por Pedro Martins, o filho do morto: “O presidente foi lá a casa e disse que a campa era de alguém que tinha morrido há 20 anos. Mas que não havia lá restos mortais de ninguém”.

A famíia terá concordado. Mesmo que a vontade do defunto até fosse outra, a de estrear uma sepultura, na zona nova do cemitério.

“Havia mais espaço no cemitério, mas há tempos, abriu-se uma cova na parte nova e as terras cederam e por isso achou-se melhor não fazer isso”, explica a advogada da Junta.

O problema acabou por ser, de facto e ninguém o nega, a existência de ossadas na cova antiga. E que foram parar ao lixo. Segundo a advogada, os coveiros “retiraram restos de tecidos sintéticos, bocados de madeira e de metal, provavelmente das pegas do caixão” da campa, que ensacaram.

“Não se aperceberam da existência de ossadas. Só repararam noutro tipo de materiais, que puseram no contentor”, defende Lara Duarte Ramos, segundo a qual, “não é normal que, passados 20 anos, haja ainda restos humanos”.

Mas, havia. E aí, “foi-se de imediato buscar o que estava no lixo e estavam lá as ossadas”.

“De imediato, a situação foi retificada e as ossadas voltaram para a campa originária, sem alarido”, sustenta a advogada, segundo a qual, “nunca em Mortágua aconteceu uma coisa destas, porque as ossadas recuperadas são sempre acondicionadas noutros locais”.

Lara Duarte Ramos assegura que o presidente da Junta está “completamente disponível para colaborar com as autoridades competentes para esclarecer toda a situação”, já que a GNR levantou um auto, encaminhado para o Ministério Público. Também o filho do defunto, Pedro Martins, reconhece que “agora é esperar”. Quanto ao falecido António Ferreira Gomes, já descansa em paz. Os que o rodearam, é que nem tanto. Como se percebe…

TVI 24

 

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