Não podemos desistir de comunicar a importância da ética no desporto. Devemos continuar a multiplicar campanhas, formações e artigos que a defendam e promovam. Mas a questão permanece: será que, depois, se pratica aquilo que se proclama? A resposta cabe a cada um na forma como vive, decide e age no seu quotidiano desportivo.
A ética desportiva não se resume a discursos inspiradores. É um exercício permanente de coerência. Nenhum código de conduta ou manual de boas práticas substitui o exemplo vivo de quem orienta, educa ou lidera. A ética exige consistência entre o que se defende e o que se faz.
Quando se toleram comportamentos incorretos apenas porque se “ganha”, a erosão moral começa aí. E é nesse instante que o desporto deixa de ser escola e passa a ser apenas competição cega e desprovida de valores. O verdadeiro valor do jogo está em respeitar regras, adversários e decisões. Sem isso, não há vitória que valha.
São vários os dilemas éticos que o desporto enfrenta. Muito ruído com o que é superficial e pouca atenção ao que verdadeiramente interessa: formar bem. Se o fizermos, vamos ter melhores atletas, melhores pais de atletas, melhores treinadores, melhores dirigentes, melhores jornalistas e principalmente melhores adeptos.
A pressão pelo sucesso precoce, a cultura clubística que sobrepõe o emblema ao espírito desportivo, a desigualdade de oportunidades ou a falta de respeito pelos árbitros e adversários são sinais de uma crise silenciosa. Continuamos, demasiadas vezes, a formar jogadores, mas não pessoas.
Em alguns clubes, o foco está demasiado centrado nas vitórias e pouco na formação integral do indivíduo. O resultado tornou-se o fim em si mesmo. Assistimos, com frequência, a comportamentos exagerados, a gritos vindos das bancadas e a uma busca incessante por triunfos que ignoram o essencial: o prazer de praticar desporto, de aprender e de crescer. Quando esse prazer desaparece, desaparece também o sentido formativo que o desporto deve ter.
E tudo começa nos adultos: o que a criança aprende sobre comportamento ético no desporto depende, antes de tudo, do que vê e sente em casa, no treino e nas bancadas.
Mais do que resultados, o desporto precisa de referências. De treinadores que eduquem, dirigentes que inspirem, pais que apoiem e atletas que compreendam que o valor do jogo está no caminho, não apenas na meta.
Os direitos das crianças, tantas vezes proclamados, continuam longe de ser plenamente cumpridos. E estamos em 2025! Em muitos contextos, o desporto de formação parece ter esquecido a sua missão educativa. A ideia de que os valores éticos valem menos do que os resultados ou as competências técnicas e táticas continua enraizada e é, simplesmente, falsa.
A prática desportiva precisa de reencontrar o seu eixo moral. Os princípios éticos devem estar no centro, e não nas margens ou à margem, do jogo.
Por isto e muito mais, a ética não é uma moda nem um discurso de ocasião. É uma forma de estar. Uma responsabilidade partilhada por todos. E só quando os valores forem mais fortes do que o marcador poderemos dizer que estamos verdadeiramente a formar campeões dentro e fora do campo.
Vitor Santos
Embaixador do Plano Nacional de Ética no Desporto
Alive FM 89.9 FM – Viseu Portal da Rádio Alive FM
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