O emigrante português Jorge Correia é conhecido no cantão suíço do Valais por Torga’s, nome da loja que abriu há 18 anos, para dar a conhecer a bebida portuguesa mais célebre em todo o mundo, o vinho do Porto.
atural de Sernancelhe, uma pequena vila do distrito de Viseu, Jorge Correia vive na Suíça há 40 anos. Numa conversa de caráter pessoal, o emigrante confessou à agência Lusa que, quando chegou, a intenção não era ficar por terras helvéticas mas o destino pregou-lhe uma partida.
“Quando cheguei à Suíça, vinha de Marrocos. A ideia era visitar um amigo que tinha aqui no Valais, mas acabei por ver neste país uma oportunidade para construir uma vida. Entretanto, conheci a minha mulher, casei e tive três filhos”, disse o emigrante à agência Lusa.
Foi no cantão que o acolheu, o Valais, conhecido pela sua região vinhateira, que o emigrante abriu a sua primeira loja, nos anos de 1990, dedicada à sua paixão pelos vinhos do Porto.
“Após me ter integrado e ter construído uma vida social, cheguei à conclusão que as pessoas aqui no Valais conheciam muito mal o vinho do Porto, sobretudo o vinho do Porto de qualidade”, disse o emigrante, salientando que foi esse motivo que o levou a abrir a sua primeira loja em Martigny – um espaço dedicado à descoberta e degustação deste vinho originário da região vinícola do Douro.
Quando questionado sobre a opinião que os suíços têm relativamente ao prestigiado vinho português, originário da região do Douro, o emigrante disse que “a maioria conhece os vinhos mais correntes, vendidos nos supermercados, que os colaboradores e amigos portugueses na Suíça lhes foram” mostrando.
“Esses vinhos não são propriamente o melhor exemplo de qualidade”, afirmou o emigrante, salientando o facto de ter contribuído ao longo dos anos, sobretudo no seu círculo mais próximo, para desmistificar a ideia que os suíços tinham de que o vinho do Porto é um vinho extremamente doce e licoroso.
“Acredito que o vinho do Porto lhes era mal servido”, justificou o emigrante, explicando que a bebida tem de ser servida à temperatura certa, para que se possa exprimir corretamente na boca, caso contrário, segundo o entendido, “não poderá ser apreciado corretamente”.
Jorge é considerado por muitos, no cantão do Valais, o embaixador do vinho do Porto na Suíça, título que, segundo o emigrante, levou tempo a ser conquistado.
“Foi na Feira do Valais, uma das maiores e mais reputadas feiras da Suíça, que me dei a conhecer aos suíços”, disse o emigrante, deixando transparecer uma grande satisfação.
“Participei pela primeira vez nesta feira em 2003. O primeiro ano foi um pouco complicado. As pessoas não se aproximavam do meu ‘stand’”, relembrou. “Quando provavam os vinhos de 20 e 30 anos de idade, ficavam agradavelmente surpresos e acabaram por se render”.
Desde então, Jorge Correia tem marcado presença na Feira do Valais, todos os anos, à exceção deste, pois a iniciativa foi cancelada, por causa da pandemia do coronavírus.
“A cada ano que participo ganho mais adeptos. Os suíços, já apreciadores do vinho do Porto, vão trazendo amigos, e o grupo de simpatizantes vai aumentado”, disse o empresário, sorrindo, destacando que o seu ‘stand’ é atualmente um dos espaços mais frequentados da Feira do Valais.
Durante o ano, é na loja Torga’s que os apreciadores desta bebida portuguesa marcam encontro, uma loja situada em pleno coração da vila de Charrat, no Valais, a segunda loja que o emigrante abriu, após ter encerrado a primeira em Martigny.
Em plena crise da covid-19, alguns dias antes de os restaurantes e bares terem encerrado na Suíça, Jorge organizou uma prova com um grupo de cinco amigos.
De sorrisos cobertos pelas máscaras, devidamente distanciados uns dos outros, era notória a satisfação dos presentes.
De copo na mão, em frente a uma mesa coberta de petiscos com assinatura portuguesa, os participantes assistiram atentamente à apresentação feita pelo empresário.
“Nas minhas provas, começamos, na maioria das vezes, pelos branco e depois vamos subindo na gama com os ‘LVB’ [Late Bottled Vintage]. Há sempre um LVB relativamente jovem e outro com mais idade, o mesmo acontece com os Vintage, para sentirmos a evolução na garrafa. Para terminar, acabamos sempre com um Tawny de 20, 30 ou 40 anos”, explica o empresário aos presentes.
“Já conheço o Jorge há 20 anos”, disse à Lusa Nicolas Reuse, um cliente regular da casa Torga’s. “Cada vez que venho a este espaço de provas, vivo um momento muito agradável de partilha, descoberta e convívio. O Jorge consegue sempre trazer até Charrat um pequeno pedaço de Portugal”.
Além de uma sala de provas, onde o empresário recebe os seus clientes, e de uma pequena loja onde se encontram alguns dos vinhos apresentados nas provas, o espaço Torga’s esconde uma cave com 2500 garrafas e uma mão cheia de paixão pela transmissão de sabores do Douro.
“Invisto sobretudo em vinhos com idades de 10, 20, 30 e 40 anos que envelhecem em garrafa. São esses que os suíços mais apreciam”, confessou o empresário.
A loja Torga’s, nome escolhido pelo empresário para homenagear o escritor português Miguel Torga – pseudónimo do médico Adolfo Rocha, natural de Trás-os Montes, nas arribas do Douro – é um negócio ao qual o ‘sernancelhence’ se dedica somente a tempo parcial.
O verdadeiro sustento de Jorge Correia vem da agricultura, uma atividade que exerce desde que chegou à Suíça, nos anos de 1980, estimulado pela família da mulher com quem se casou, todos eles agricultores de profissão.
“Quando o meu sogro se reformou, fui eu e o meu cunhado que ficámos com a empresa. Desde então, conseguimos duplicar o número de terrenos de que dispúnhamos no início”, disse Jorge Correia, deixando transparecer o seu orgulho.
Atualmente, os cunhados cultivam cerca de 20 hectares de terras, onde plantam pera rocha, alperce e maçã.
Na hora da despedida, Jorge Correia confessou à agência Lusa que o seu maior sonho seria passar o seu negócio principal, o da agricultura, para os filhos e investir mais tempo e energia no seu negócio de provas de vinho do Porto.
“O meu sonho é dar a conhecer ao máximo de pessoas a região do Douro, organizando pequenas viagens de descoberta à região vinhateira portuguesa mais conhecida a nível mundial”, concluiu o emigrante.
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